Sunday 14 April 2024

Calçada de Carriche: Posto de abastecimento de combustíveis

O Desfiladeiro de Carriche, denominação já do tempo da ocupação romana, deu lugar à Calçada de Carriche, topónimo derivado de pedra qualquer que seja a sua origem e no século XX até mereceu honra de ser o título de um poema de António Gedeão, de 1958.

Daí a três quartos de hora, já com os Crespos arrumados em cima de nós, água no radiador, o tanque cheio de gasolina, e uma decisão tremenda de irmos assim até ao Porto, até Paredes, até o cabo do mundo — já ao fundo da Calçada de Carriche, a dona Alzira dá um grito! Os freios guincham, pula o carro, e "que foi? que foi?" — a dona Alzira tem dúvidas pálidas, inquietações, terrores, crava-me as unhas todas num braço: não sabe se deixou o gás apagado e o contador fechado!
(MIGUÉIS, José Rodrigues, Léah E Outras Histórias, 1958)
Calçada de Carriche |1961|
Posto de abastecimento de combustíveis
Arnaldo Madureira, in Lisboa de Antigamente
Calçada de Carriche |1961|
Posto de abastecimento de combustíveis
Arnaldo Madureira, in Lisboa de Antigamente

Friday 12 April 2024

Praça do Príncipe Real: a Patriarcal e a Praça do Rio de Janeiro

Foi sítio das «Obras do Conde de Tarouca», das «Casas do Conde de Tarouca» e das «Terras do Conde de Tarouca» (anteriormente a 1755); «Patriarcal Queimada» e «Largo das Pedras» (depois de 1769); «Obras do Erário Novo» (em 1810), «Erário Régio» (em 1813), «Covas da Patriarcal» e «Pedras da Patriarcal» (à roda de 1820); «Caboucos do Erário» (entre 1825 e 1849), «Praça do Príncipe Real» (em 1855, embora o edital camarário se publicasse em 1 de Setembro de 1859) e «Praça do Rio de Janeiro» (em 1910, edital de 5 de Novembro).

Praça do Príncipe Real: a Patriarcal e a Praça do Rio de Janeiro |entre 1908 e 1914|
Junto à Cç. da Patriarcal; ao fundo vê-se a embocadura da Rua da Escola Politécnica.
Destaque para o empedrado artístico no passeio em frente ao n.º 27. moradia (rés-do-chão e 2 andares), da riquíssima família Sommer. O seu primeiro proprietário foi José Ribeiro da Cunha, que aí viveu enquanto não lhe aprontaram o «prédio dos torreões».
Charles Chusseau-Flaviens, in Lisboa de Antigamente

As «Manas Perliquitetes», duas curiosíssimas figuras da Lisboa pacata século XIX, que moravam à Escola Politécnica, também deambularam pelo jardim e procuravam este lugar romântico, a cismar com o Amor, à espera dos seus cavaleiros andantes, que nunca se prostraram a seus pés. Mestre Matos Sequeira ainda conheceu estas celebridades de pitoresca excentricidade e a seu modo escreveu uma curiosa crónica, em que expande, com o maior interesse, a vida caricata das inofensivas manas, Carolina Amália e Josefina Adelaide Brandi Guido, descendentes de duas famílias de duas famílias de origem italiana, e que não puderam furtar-se ao lápis humorístico de Bordalo Pinheiro e à graça satírica das «revistas» da época. [Costa, Mário, 1959]

Sunday 7 April 2024

Lavadeiras saloias no Campo Grande

Entre os trabalhadores de condição servil foram muito populares em Lisboa, onde deram origem a perfis profissionais bem definidos os seguintes: as lavadeiras saloias, vindas de Caneças ou de Loures, transportando-se em burricos ou em carroças com as suas enormes trouxas de roupa. [...]
As carroças das lavadeiras de Caneças estacionam nas velhas estalagens do Jardim do Regedor ou do Borratém, enquanto as boas mulheres se espalham na Cidade, de trouxa à cabeça.
(O POVO DE LISBOA: Tipos, Ambiente, Modos de Vida, Mercados e Feiras, Divertimentos, Mentalidade. 1979)

Campo Grande |190-|
Carroças transportando lavadeiras com suas trouxas de roupa.
Paulo Guedes, in Lisboa de Antigamente

Friday 5 April 2024

Rua do Merca-Tudo

Mestre Júlio de Castilho atribui a origem deste topónimo a duas figuras diferentes: uma delas terá sido, segundo o autor de A ribeira de Lisboa, um tal Afonso Alves – de quem já aqui falámos. A outra será um João Fernandes a quem ele aqui se refere no fim deste texto na obra Lisboa Antiga: «Outras alcunhas deixam de ser épicas, e limitam-se apenas a ser gaiatas. Que o demonstrem: Diogo Lopes de Sousa, que pelo seu génio inquieto ficou o traquinas; Jorge de Sousa, no seculo xvi, a quem as damas do paço puseram o diabo, pelas muitas travessuras que lá fazia em pequeno; ou D. Gonçalo Annes Tello, a quem talvez as suas finuras deram o cognomento de o raposo; ou João Gomes, o cheira-dinheiro; ou João Fernandes, o Merca-tudo, que pela sua maravilhosa ganância, e pela sua astúcia em alborcar, conseguiu deixar nome a certa rua á Esperança, e entroncar-se em famílias ilustres».
(CASTILHO, Júlio de, Lisboa Antiga, 1885)

Rua do Merca-tudo, venda ambulante |1950|
Tv. dos Pescadores (dir.); ao fundo nota-se a Av. D. Carlos I
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

Sunday 31 March 2024

Café Palladium: quiosque-esplanada

Os novos cafés da Avenida da Liberdade começam a impor presença importante a partir de 1920 — recorda Marina T. Dias. O Café Palladium, projectado por Raul Tojal, ocupou em 1932, o piso térreo de um dos mais interessantes exemplos arquitectónicos do primeiro número da Avenida (edifício de Norte Júnior construído em 1909), antigas instalações da clínica de Henrique Basto. Foi louvado como expoente máximo de modernidade, levando proprietários de casas congéneres (como o Nicola e o Chave d' Ouro) a encomendar projectos de alteração do interior dos seus estabelecimentos ao mesmo arquitecto.
Mário Dionísio refere o Palladium como centro de tertúlia desde final dos anos 30. Seria, ao longo das décadas seguintes, local muito procurado por estudantes e intelectuais da oposição, surrealistas incluídos. [...] 
 
Café Palladium |196-|
Avenida da Liberdade
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente
 
Alguns elementos da decoração interior (incluindo baixos-relevos e pormenores do varandim) foram aproveitados pelo centro comercial que lhe sucedeu.
Apesar de ter beneficiado de grandes obras em 1972, encerrou poucos anos mais tarde, dando lugar a um centro comercial. [Dias: 1999]

Café Palladium: quiosque-esplanada |1935-07-28|
Avenida da Liberdade
Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

No ano de 1933, o arq.° Cassiano Branco projecta um quiosque-esplanada para o Café Palladium, inaugurado no ano anterior, localizado a cimo do Restauradores, onde se inicia a avenida da Liberdade. Este equipamento, infelizmente já demolido, desenvolvia-se em torno de um pilar redondo, envolvido por uma estrutura de ferro e vidro e era composto por dois pisos. Aproxima-se esteticamente à cultura internacional, integrando-se no desejo de Cassiano Branco de transformar Lisboa, e particularmente esta artéria, para a qual projectou a esmagadora maioria dos seus trabalhos, numa grande metrópole moderna, plena de edifícios modernos, salas de espectáculos, cafés e outros espaços de ócio, luz e movimento, à imagem das principais cidades europeias. [Mártires Batista: 2015]

Quiosque-esplanada para o Café Palladium |1933|
Avenida da Liberdade

Fotógrafo não identificado, in Lisboa de Antigamente

Friday 29 March 2024

Rua General Farinha Beirão

Augusto Manuel Farinha Beirão (1869–1942), filho de um advogado de Pinhel, foi um militar que começou no regimento de Infantaria da sua cidade natal e se distinguiu na pacificação de Huíla, em Angola, nos períodos de 1906-1908 e de 1913-1921, que também integrou o Corpo Expedicionário Português em França durante a I Guerra, nomeadamente sob o comando do General Garcia Rosado, nomeadamente, na tomada de Lille.
Foi também comandante da Escola Prática de Infantaria em 1926 e 1927, onde se distinguiu na repressão à revolta de Fevereiro de 1927, a primeira tentativa reviralhista contra a Ditadura Nacional, passando em 31 de março de 1928 a ser o Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, onde continuou a defesa do Estado Novo, particularmente no combate à Revolta de 26 de agosto de 1931, tendo mesmo havido um Prémio General Farinha Beirão para agraciar o melhor comandante de posto territorial da GNR em cada ano.

Rua General Farinha Beirão |1961|
Herói do Ultramar 1869 - 1942
Antiga Rua B, do chamado Bairro Catarino; Rua Joaquim Bonifácio
Arnaldo Madureira, in Lisboa de Antigamente

Refira-se ainda que Farinha Beirão foi desde a primeira hora adepto do golpe militar de 28 de Maio de 1926 e que a partir de 1936 presidiu à Cruzada Nacional Nun’Álvares, um movimento apoiante do Estado Novo se extinguiu em 1938.
Farinha Beirão foi condecorado com a Ordem da Torre e Espada (em 1908 e 1939), o Grande Colar da Ordem de Cristo e da Ordem de Avis (ambos em 1931) e ainda com a Ordem do Império (1932).

Sunday 24 March 2024

Rua Nova do Almada, à Boa Hora

À direita, sul, desce a Rua Nova do Almada, artéria já existente desde 1665 — recorda Norberto de Araújo — ainda que, precisamente, não arruada e rectificada, como depois de 1755 o foi. Deu o nome à Rua Rui Fernandes de Almada, que foi presidente do Senado Municipal.

À semelhança das outras ruas do Chiado, também esta artéria foi conhecida pelas suas magnificas lojas de que se destacavam o «Eduardo Martins», a «Casa Batalha» e a «Pastelaria Ferrari», desaparecidas aquando do incêndio de Agosto de 1988.
Até aos anos 50, do século XX, também ali esteve a Igreja da Conceição Nova construída em 1698 e restaurada depois do Terramoto de 1755. O arquitecto da reconstrução foi Remígio Francisco de Abreu.

Largo da Boa Hora |1908|
Cruzamento das ruas Nova do Almada e de São Nicolau (esq.)
Vendedor ambulante de gelados
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente
Nota(s): Foto erradamente catalogada no abandalhado AML como Rua do Loreto.
Rua Nova do Almada |1918|
Junto ao Largo da Boa-Hora
Luís Pastor de Macedo adianta que a Rua Nova do Almada foi criada por carta de lei de 17 de Junho de 1787.
Joshua Benoliel, in Lisboa de Antigamente

Aqui temos o Largo da Boa Hora, com seu sinistro casarão do Tribunal, o repulsivo Tribunal da Comarca de Lisboa, actualmente em obras, mas que continuará. a ser, mesmo asseado e limpo, um aleijão, simulacro ridículo de um vago Palácio da Justiça — que, parece, nunca veremos de pé.==
(ARAÚJO, Norberto de, «Peregrinações em Lisboa», vol. XII, p. 90, 1939)

O topónimo Boa-Hora provém do Convento da Boa-Hora que hoje conhecemos no local como Tribunal da Boa-Hora.
A designação São Nicolau deriva da proximidade à antiga Igreja de S. Nicolau que foi reedificada pela primeira vez em 1280 e após o Terramoto, quase foi construída toda de novo, com obras que decorreram de 1780 a 1850.

Rua Nova do Almada |1967|
Junto ao Largo da Boa Hora
Vasco Gouveia de Figueiredo, in Lisboa de Antigamente
Rua Nova do Almada |1965-03|
Junto ao Largo da Boa Hora com a Rua de S. Nicolau
Armando Serôdio, in Lisboa de Antigamente

Friday 22 March 2024

Convento do Rego: antiga igreja do Hospital Curry Cabral

De acordo com o olisipógrafo Norberto de Araújo no sitio onde está actualmente o Hospital Curry Cabral «assentou o Convento das Convertidas de Nossa Senhora do Rosário, de religiosas franciscanas, fundado depois de 1768 por D. Margarida das Mercês de Maré, dama francesa e mais tarde chamado do Rosário e das Dores [...]. Deve-se a D. Maria I a ampliação do Real Recolhimento do Rego e a construção da Igreja, da qual aí tens apenas a fachada, cujo pórtico é sobrepujado pelas armas reais da «Piedosa».
Extintas as ordens religiosas e morta a última freira, o Recolhimento conventual na aparência e na missão, esteve muitos anos abandonado. (...) Em 1905 foi transformado (Hintze Ribeiro) em Hospital para doenças infecciosas [...]

Antiga capela do Hospital Curry Cabral |1944|
|Demolida na década de 1950|
Rua da Beneficência, antes Largo do Rego à Palma de Cima
Eduardo Portugal, in Lisboa de Antigamente

A Igreja do antigo Convento, que em tempos serviu de depósito e, durante algum tempo, de casa mortuária, está desde há muito desmantelada; não possuiu, aliás, valor artístico. Desde 1935 foi cedida ao Patriarcado para depósito de imagens e acessórios que pertenceram à Igreja de S. Julião, substituída, como já to tenho dito, pela vizinha Igreja, nova, de N. Senhora de Fátima.==
(ARAÚJO, Norberto de, Peregrinações em Lisboa, vol. XIV, pp. 58-59, 1939)

Igreja e Convento das Convertidas de Nossa Senhora do Rosário |1840|
Pereira, Luís Gonzaga, 1796-1868l, in Lisboa de Antigamente

N.B. Outras designações :Convento de Nossa Senhora das Dores de Lisboa; Convento de Nossa Senhora do Rosário das Dores; Convento do Rego; Recolhimento de Nossa Senhora das Dores e Santíssimo Rosário; Recolhimento das Convertidas do Rêgo; Recolhimento das Mulheres Perdidas do Rego; Recolhimento da Associação das Servitas de Nossa Senhora das Dores.
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